Posição conjunta Performart, Plateia e REDE sobre a revisão legislativa Apoio às Artes e legislação RTCP
Preâmbulo
A presente posição resulta de um trabalho interassociativo sistematizado face às questões
levantadas pela análise da legislação que enquadrará o Apoio às Artes e a RTCP, e cujo
desfecho será determinante para o futuro do sector.
Esta posição complementa os pareceres já apresentados pelas três entidades, que
resultaram da reflexão feita junto dos seus respectivos associados, e em caso algum os
anula.
Política Cultural
Todos os instrumentos de atribuição de financiamento público devem ser suportados numa
política cultural clara, esclarecida, independente e estruturante.
Assim, não só é crucial uma análise articulada e cuidada entre o Apoio às Artes e a RTCP,
como reivindicamos o estabelecimento de um diálogo sistemático entre o Estado e o poder
local, bem como uma articulação estratégica entre ambos e que inclua outros organismos,
tais como DRCs, CCDRs e CIMs, que seja plasmada em planos estratégicos plurianuais.
Esta articulação orgânica e, paralelamente, a necessária requalificação das Direções
Regionais de Cultura configuram as condições para uma real alteração estrutural a nível do
território nacional que garanta o direito à participação cultural tal como consagrado na
Constituição.
Dotação financeira
Reivindicamos, como compromisso para o Apoio às Artes que, cada concurso, em cada
quadro de apoio, tenha uma dotação financeira igual ao valor total solicitado (a soma de
todos os valores pedidos por todas as candidaturas) no ciclo ou concurso anterior,
acrescida da inflação em cada ano. Este aumento de verbas deve acomodar ainda a
valorização salarial dos profissionais e a melhoria das suas condições laborais, em
conformidade com o que será estabelecido no novo Estatuto dos Profissionais da Área da
Cultura, para além do expectável crescimento do sector.
Relativamente à RTCP, a sua existência só pode ser considerada no quadro de uma
afectação adequada de verbas, que permita tanto o lançamento deste novo instrumento
como o seu desenvolvimento e crescimento.
Acrescentamos que esta verba tem de se somar, e nunca comprometer a dotação
disponível para o Apoio às Artes. Trata-se de dois instrumentos que em caso algum se
substituem e cuja complementaridade só pode ser concretizada com os meios adequados.
ASPECTOS TRANSVERSAIS AO APOIO ÀS ARTES E À RTCP
Como já referimos, a visão estratégica que enquadra os vários instrumentos de
financiamento é fundamental para a sua implementação e desenvolvimento bem
sucedidos. Assim, em primeiro lugar, não concordamos com a proposta de
desaparecimento do Plano Estratégico Plurianual e não compreendemos o que a motiva. O
Plano Estratégico Plurianual (PEP) parece-nos uma ferramenta importante, por permitir
plasmar para um horizonte temporal concreto propostas estratégicas e metas, tornando
mais clara a visão de política cultural e estabelecendo um compromisso transversal ao
território, para os organismos da tutela e para o sector. O PEP deverá passar a incluir a
RTCP.
Do mesmo modo, não concordamos com a proposta de mudança da data de publicação
da Declaração Anual — ela deve manter-se em Novembro de cada ano e não após a
publicação da Lei do OE. Isto seria um retrocesso relativamente à discussão ocorrida em
2018 no seio do GTMAA e, por outro lado, não é coerente com a realidade atual, visto que
a cada ano abrem programas de apoio que dizem respeito a projetos a implementar no ou
a partir do ano civil seguinte. Logo, a Declaração Anual de cada ano diz respeito a um
compromisso para um ciclo de trabalho (no caso anual) ao qual a dotação orçamental deve
corresponder, e não o contrário. Tal como o PEP a Declaração Anual deverá passar a
incluir a RTCP.
Defendemos que todos os apoios devem ser atribuídos através de concurso público com
comissões de apreciação.
Defendemos ainda que, para todos os concursos, deve ser indicada no aviso de abertura a
data concreta em que serão divulgados os resultados.
APOIO ÀS ARTES
Prazos para apresentação de candidatura (Artigo 17º da Portaria)
Sugerimos que estes prazos sejam aumentados para:
45 dias - Programa de Apoio Sustentado
30 dias - Programas de Apoio a Projetos e em Parceria
Sugerimos, em particular, que os avisos de abertura de cada concurso sejam divulgados,
no mínimo, 15 dias antes da abertura do mesmo.
Taxa de dependência da DGArtes vs Avaliação do critério de Viabilidade/Gestão
Muito embora não seja explícita na legislação ou nos Avisos de Abertura qualquer
obrigatoriedade no que concerne a taxa de dependência que o orçamento de uma
candidatura revela do financiamento da DGArtes, na avaliação das candidaturas as
Comissões de Apreciação têm-se referido à mesma como factor determinante na análise
da viabilidade. Consideramos que este ponto deve ser explicitado junto das Comissões de
Apreciação, já que a consistência de um projeto de gestão ou a viabilidade de um projeto
não se avalia apenas pela taxa de dependência da DGArtes, mas pela forma como são
geridos os recursos em função do programa de atividades proposto, tal como aliás é
referido na atual Portaria.
Programa de Apoio Sustentado
Não concordamos com a abertura trienal de concursos e não compreendemos o que
motiva esta proposta de alteração. Não há nenhuma razão objetiva para introduzir um
factor de descontinuidade numa prática que até à data não se revelou desadequada.
Aquilo que o sector tem vindo a reivindicar é a maior duração dos ciclos de apoio, o que,
introduzida a possibilidade de renovação como se sugere nesta proposta legislativa, pode
tornar-se uma realidade para muitas estruturas.
Existem várias estruturas que desenvolvem uma atividade de execução de médio prazo,
não apenas porque não lhes é possível fazê-lo de outra forma, mas porque isso
corresponde ao desenho dos seus projetos. A existência de distintas temporalidades de
apoio admite melhor concordância com as diferentes tipologias de projeto e ciclos de
trabalho.
Por fim, se já era grave para uma estrutura ficar sem apoio por um período de dois anos,
no caso de não conseguir apoio sustentado, um hiato de três anos entre concursos
dificulta muito mais a sua recuperação e poderá simplesmente provocar o seu
desaparecimento. Da mesma forma que estruturas que pretendam candidatar-se pela
primeira vez a Apoio Sustentado terão de aguardar muito mais tempo antes de poderem
submeter o seu projeto.
Assim, o Apoio Sustentado deve continuar a ser atribuído para períodos de 2 e de 4 anos e
deve haver possibilidade de renovação em ambas as modalidades. Os concursos devem
abrir, em ambos os casos, a cada 2 anos.
Em linha com esta posição, não concordamos com o aumento de quatro para cinco anos
de atividade profissional continuada como condição de acesso ao Programa de Apoio
Sustentado. Em consonância com a manutenção de ciclos de apoio bienais e quadrienais,
reiteramos a sugestão de alteração ao DL nº103/2017, de o requisito de exigência mínima
de quatro anos de atividade profissional continuada passe para dois anos, na modalidade
bienal, e de seis para quatro anos, na modalidade quadrienal, bem como, ainda nesta
modalidade, alterar o requisito da exigência do apoio do Estado através da DGArtes de um
período mínimo de quatro anos para um período mínimo de dois anos.
Custos com estrutura
Defendemos que, no caso do Programa de Apoio Sustentado, as despesas com custos de
estrutura devem poder representar mais do que 50% das despesas apresentadas,
considerando que, dependendo da natureza dos projetos, as entidades podem ter
encargos elevados com despesas de gestão e manutenção de espaços e contratação de
equipas. Existem muitas entidades com estes encargos, cuja especificidade deve ser
acautelada para um salutar e justo desenvolvimento da atividade.
Atribuição do apoio financeiro/ Patamares (Artigos 23º e 25º da Portaria)
Sugerimos que o apoio financeiro seja atribuído por patamares e não com base numa
percentagem correspondente à pontuação atribuída pelas comissões de apreciação, ou
seja, que as entidades recebam o montante solicitado, seja ele qual for, dentro do patamar
a que concorrem.
Programa de Apoio a Projetos
Sugerimos que venha expressamente mencionado na Portaria respectiva que todos os
anos abrem concursos para apoio a projetos em todos os domínios de atividade (criação,
programação, circulação, internacionalização, mediação, edição, investigação), sem
prejuízo de virem a abrir outros domínios que oportunamente se considerem relevantes,
como, por exemplo, apoio ao trabalho de arquivo/ documentação, que vem ganhando
cada vez mais pertinência.
REDE DE TEATROS E CINETEATROS PORTUGUESES
A presente proposta de redação não traduz, do nosso ponto de vista, uma visão clara
sobre o seu objetivo e estratégia, em particular sobre o faseamento e prioridades da
implementação da RTCP. Existem vários pontos omissos ou ambíguos no que diz respeito
ao Programa de Apoio à RTCP, parecendo mesmo faltar uma Portaria própria, sendo por
outro lado a Portaria relativa à credenciação bastante exigente e tendencialmente
exclusiva.
Sugerimos, assim, a criação de uma Portaria que consagre vários dos aspetos abaixo
enunciados, além de aspetos relativos à implementação faseada da RTCP, que vincule um
compromisso com uma mais equilibrada distribuição territorial e em particular com os
territórios mais periféricos/ interiores.
Programa de Apoio à RTCP (DL661/XXII/2020)
Sugerimos que o ciclo de apoio no âmbito da RTCP seja quadrienal e não trienal,
garantindo assim maior estabilidade no desenvolvimento da atividade.
Acrescentamos que, do ponto de vista do calendário, estes concursos devem ser
desfasados dos concursos para apoio sustentado.
Âmbito de Aplicação (Artigo 3º)
No ponto 1, retirar a alínea a).
Não nos parece fazer sentido que no caso da RTCP sejam incluídas “entidades que
exerçam, a título predominante” atividade em áreas artísticas como as “artes plásticas,
arquitetura, design, fotografia ou novos media”. Consideramos que RTCP se deverá focar
nas artes performativas e exibição cinematográfica, que não estão consideradas em
nenhuma rede específica de equipamentos.
Forma de atribuição - Artigo 9º
Reivindicamos que este apoio seja concedido através de concurso público com comissões
de apreciação. Esta forma de avaliação dos projetos é aquela que nos parece mais
adequada como garante de independência, transparência e qualidade.
Abertura do programa de apoio - Artigo 10º
A abertura de um concurso público, como entendemos que é necessário para a atribuição
deste financiamento, requer necessariamente a regulamentação através de uma portaria,
onde devem estar plasmados os aspetos estruturantes deste DL.
Apreciação de candidaturas - Artigo 15º
Consideramos, na linha do que é dito em cima, que o apoio deve ser atribuído por
concurso público.
Critérios de apreciação - Artigo 16º
Independentemente dos requisitos do plano de programação elencados neste artigo, deve
a composição, qualificação e adequação das equipas destes equipamentos ser tida em
conta na apreciação das candidaturas. Desde logo, deve ser considerada a concordância
com o Estatuto dos Profissionais da Área Cultura em discussão, bem como deve ser
valorizada a formação e a experiência profissional adequadas de modo a garantir a
qualidade do trabalho desenvolvido e da oferta artística.
Determinação do montante do apoio financeiro - Artigo 17º
Sugerimos que sejam definidos patamares financeiros de apoio e que, tal como
defendemos no caso do Programa de Apoio Sustentado, as entidades recebam o
montante solicitado, seja ele qual for, dentro do patamar a que concorrem.
Credenciação (Portaria)
Recursos humanos - Artigo 6ª
No ponto 2, sugerimos retirar “coordenação de programação” e a competência de
"execução". A designação “coordenação” não acautela a necessária autonomia de uma
direção artística ou de programação.
Relativamente ao ponto 4, consideramos que esta estrutura de funções pode ser
demasiado restritiva. A nomenclatura das funções devia ser mais abrangente e mais
adequada à realidade do sector. A gestão de um espaço cultural divide-se essencialmente
em: Programação, Técnica, Produção, Comunicação e Mediação e deve pugnar-se pela
qualificação profissional das suas equipas.
Instalações e equipamentos - Artigo 7º
As condições aqui elencadas são muito exigentes e nada adequadas à realidade da
maioria dos teatros e cineteatros, e são aliás contraditórias com a ideia de recinto definida
na lei 81/2019 de 2 de setembro. Deveria considerar-se apenas o disposto no ponto 5
deste artigo, sendo essa a generalidade e não a exceção.
Deve também, ser garantido o acesso a pessoas com mobilidade reduzida, sejam elas
elementos do público ou artistas ou parte da equipa do equipamento, em todos os
espaços do equipamento.
Anexo (Formulário)
A lei portuguesa define o voluntário como alguém que realiza um conjunto de ações de
interesse social e comunitário, de forma desinteressada, sem interesses lucrativos, no
âmbito de projetos, programas e outras formas de intervenção ao serviço de indivíduos, de
famílias e de comunidades. Não pode nunca ocupar tarefas permanentes ou de
substituição de um trabalhador. Não pode, portanto, um voluntário fazer parte da lista de
Recursos Humanos necessários à credenciação.
18/02/2021
Performart
Plateia
REDE