REDE - Associação para a Dança Contemporânea

2/11/2022 COMUNICADO DA REDE EM REAÇÃO AO PROJECTO DE DECISÃO DO PROGRAMA DE APOIO SUSTENTADO 2023/2026 DANÇA — CRIAÇÃO

COMUNICADO DA REDE EM REAÇÃO AO PROJECTO DE DECISÃO DO PROGRAMA DE APOIO SUSTENTADO 2023/2026 DANÇA — CRIAÇÃO

É sem surpresa, mas com total indignação que a REDE — ASSOCIAÇÃO DE ESTRUTURAS PARA A DANÇA CONTEMPORÂNEA vem constatar uma enorme razia nos resultados provisórios do Programa de Apoio Sustentado — Bienal — Dança — Criação que preveem apoio a apenas 38% das estruturas candidatas (8 estruturas), a menor porcentagem por área artística nos resultados até agora anunciados, abaixo dos bienais de 2020/2021 (com 9 estruturas apoiadas, equivalente a 60%). Os atuais resultados provisórios, em vez de beneficiarem novas estruturas, descontinuaram o apoio sustentado a cinco estruturas até agora apoiadas, entre as quais a Companhia Clara Andermatt, o Ballet Contemporâneo do Norte e a Kale – Armazém 22, assim como deixaram de fora sete estruturas elegíveis, entre as quais Agência 25, Pensamento Avulso, Produções Independentes e Associação Quorum Cultural.

Este cenário contradiz aquilo que a DGARTES e o Ministério da Cultura anunciaram e defenderam nas suas últimas intervenções, nomeadamente a quebra histórica com o subfinanciamento para as artes no país. Mas parece ainda mais gritante na área da Dança quando observamos a disparidade entre o valor atribuído aos bienais nesta área face ao número de candidatos e face às outras áreas artísticas cujos resultados foram divulgados em simultâneo. Esta constatação leva-nos a questionar a razão pela qual a Dança é a área artística com menor dotação orçamental da DGARTES apesar do seu crescimento exponencial. Com o desinvestimento nestas estruturas que criam oportunidades de trabalho e futuro, aumenta também o fosso entre o ensino da dança e a realidade do que é o trabalho da dança em Portugal. Será que a dança contemporânea não é uma prioridade para esta governação? Será que o questionamento do corpo na sociedade, próprio da dança contemporânea, está longe de ser estruturante apesar das crises pandémicas e das situações de guerra atuais sugerirem o contrário?

Desde o anúncio do Programa de Apoio Sustentado, a REDE alertou para a disparidade entre os números dos apoios e as necessidades do sector. No momento de submissão das candidaturas, a REDE apresentou com clareza os problemas de subfinanciamento tanto dos bienais como dos quadrienais. Apesar da resposta da DGARTES ter desprezado a nossa argumentação — defendendo a fuga de estruturas para o Programa de Apoio em Programação, o que, obviamente, não aconteceu —, meses mais tarde, foram anunciados reforços até então inimagináveis. No entanto, tais reforços foram surpreendentemente destinados apenas aos quadrienais e não de forma proporcional a todos os sustentados. A DGARTES conquista o feito de aumentar o seu orçamento para Apoios Sustentados de forma ímpar na história recente, mas a DGARTES não é eficaz, justa, nem prudente na divisão dos recursos pelas respectivas áreas artísticas, revelando, ao invés, uma incoerência política na sua distribuição. Com isto, em vez de se acrescentarem apoios à Dança, está-se apenas a substituir os que existiam. Veja-se um resumo da história mais recente de apoios do Estado à Dança:

2018-2021 — último quadriénio

11 apoios quadrienais em 2018-2021

10 apoios bienais em 2018-2019

9 apoios bienais em 2020-2021

2023-2026 — atual quadriénio

11 apoios quadrienais 2023-2026

8 apoios bienais em 2023-2024

Não há nem pode haver crescimento algum na área da Dança! A única alteração em 9 anos é a garantia de maior sustentabilidade para 11 estruturas de criação de dança que são apoiadas por quadrienal. Nos bienais saem uns, entram outros. Há 8 apoiados, 5 deles com 60.000€, 1 com 120.000€ e 2 com 180.000€. O aumento de verba na Dança beneficiou o mesmo número de projectos que no quadriénio anterior mas agora com mais apoio, permitindo maior sustentabilidade às estruturas com quadrienal, que concorreram a apoios a partir dos 120 mil euros, o que é muito louvável. Mas não conseguiu valorizar de forma proporcional os concorrentes a apoios bienais, que aliás diminuíram em número de apoiados face ao biénio 2020-2021. O concurso apenas considerou mais 60 mil euros que na edição anterior, miseravelmente 780.000€ ano / 1.560.000 € biénio, um aumento de apenas 4% face ao ciclo anterior. Este valor é manifestamente insuficiente para actualizar apoios continuados e responder à dinâmica natural do tecido artístico que, por si só, já revela evidentes dificuldades de expansão territorial, e concentração de projectos nas regiões de AML e Norte, agora ainda mais desfalcadas por estes resultados.

Na área da Dança foi onde se verificou menos investimento de verba para os Apoios Sustentados desde o lançamento dos concursos, muito embora tenha quase duplicado a dotação dos quadrienais, deixando antever os péssimos resultados agora verificados nos bienais. O Estado salvaguarda investimento na Dança em 10 milhões e 840 mil euros nos próximos 4 anos, gastando 3 milhões e 100 mil por ano nos próximos dois (entre bienais e quadrienais) para apenas 19 estruturas. É muito pouco, quando a Dança é uma das áreas com maior vigor nacional e internacional em claro ciclo crescente. Neste concurso ficaram de fora 13 das 21 estruturas proponentes — das quais cinco perderam o apoio sustentado que tinham — isto apesar de apenas uma estrutura ter avaliação inferior a 60%, percentagem limite para não ser elegível a apoio. Este triste facto vem recordar o desastroso processo pós-troika que levou a que estruturas como a Re.Al, fundamentais no tecido da dança contemporânea, fossem dizimadas após 30 anos de serviço público para a Dança.

A REDE solidariza-se com todas as estruturas que viram o seu apoio descontinuado, sem que os seus projectos artísticos tenham perdido qualidade, merecedores de avaliações bastante positivas, até superiores às dos quadrienais, e também com todas aquelas cuja oportunidade de ter um apoio pela primeira vez num programa plurianual se afastou novamente por mais dois anos. Sem falar da possibilidade de concorrer, no futuro, a quadrienal, porque, para estes, essa adiou-se por mais oito anos (já que os atuais regulamentos do Programa de Apoio Sustentado obrigam a 4 anos de apoio anteriores para atingir elegibilidade).

Face ao insuficiente montante de apoio disponível para o Programa de Apoio Sustentado Bienal em Dança — Criação, a REDE exige um reforço de verba dos bienais proporcional às outras áreas, no valor global de 3.000.000 €, para apoio às candidaturas não propostas a apoio, com pontuação acima de 70%, subindo os apoios da Dança para 31 apoiados (11 quadrienais e 20 bienais), investimento absolutamente essencial para a consolidação e desenvolvimento de todos estes importantes projectos no território e, consequentemente, um sinal político que reconhece que a criação artística nesta área carece brutalmente de incentivo estatal. Aumentar o investimento do Ministério da Cultura para 4.600.000 €/ano significaria apoiar 31 projetos, mais 12 do que os agora anunciados, totalizando o valor global para a área de 13.840 000,00 €. É uma pequena grande diferença, ainda assim, abaixo do investimento em áreas como a Música e Ópera ou os Cruzamentos Disciplinares, mas que tenta aproximar-se destas áreas em termos de proporcionalidade. Não obstante, é posicionamento da REDE que todos os projetos elegíveis de cada área devem ser apoiados.

Não bastará dizer ainda que, contrariamente à música, ao teatro e às artes visuais, não existem em Portugal quaisquer instituições nacionais (públicas ou privadas) dedicadas com exclusividade à dança contemporânea e que isso constitui, de base, uma disparidade de investimento e dignificação da prática.

A REDE disponibiliza-se ainda para prestar declarações e encontrar soluções para esta crise de financiamento no sector provocada pela gestão deficitária dos ditos concursos.

Em anexo apresentamos uma leitura comparada dos montantes de apoio, projectos candidatos e apoiados. Estuto comparativo orçamentos.xlsx

Atentamente,

REDE

3 de novembro de 2022

Fontes:

https://www.dgartes.gov.pt/pt/noticia/5753